quinta-feira, 16 de junho de 2011

Apagão Profissional ou Preconceito

Fonte: Coluna no GLOBO - Enviado por Míriam Leitão, Alvaro Gribel e Valéria Maniero

Empresas reclamam de apagão de mão de obra. Brasileiros qualificados procuram emprego. São barrados por não terem experiência, ou por serem mais velhos, ou por não passarem nos burocráticos padrões de recrutamento. As empresas perdem chance por discriminar. Falamos com desempregados e empresas para entender as contradições do mercado de trabalho.

Fomos a campo usando as ferramentas das novas mídias. Postamos no Twitter convites para que as pessoas com qualificação mas sem chance no mercado de trabalho contassem as suas histórias. Gravei um vídeo fazendo o mesmo convite, postei no blog, e foi chamado no site do Boa Chance. Alvaro Gribel, Valéria Maniero e eu recebemos as histórias e conversamos diretamente com alguns. Postamos casos no blog. Em quatro dias, recebemos mais de 200 e-mails e 150 comentários.

Márcio Felipe é técnico em informática, com experiência em empresas no Brasil e em Portugal. O setor de TI nos disse que tem carência de 100 mil pessoas. Ele procura diariamente emprego e não encontra. O que está errado com ele? Dizem que é a idade: tem 45 anos. Mariana Cordeiro tem 28 anos, é formada em marketing há seis anos e, durante esse período, está procurando emprego. Mesmo sendo contra "panfletar" currículo, ela se cadastrou num site especializado que enviou suas informações para 7.234 empresas. Recebeu três respostas, mas sempre acabou ouvindo aquele desanimador: "você não tem o perfil":

— Se os recrutadores dessem retorno, eu poderia saber em que estou errando.

Ela continuará procurando e diz que se as empresas soubessem "da disposição e desejo de várias pessoas como eu, pensariam duas vezes antes de simplesmente descartar nossos currículos".

Renato Teixeira é engenheiro de transportes, tem 35 anos de experiência, como o de ser diretor de Planejamento do Metrô do Rio. Não consegue emprego porque tem 58 anos. Lucas Camilo formou-se em publicidade, está fazendo um MBA na FGV, mas não consegue o primeiro trabalho. Dizem que ele não tem experiência. Eduardo Azevedo é engenheiro eletrônico, com pós-graduação na Coppe em sistema Offshore, faz mestrado na UFRJ em engenharia naval. Trabalha em TI, mas seu sonho é trabalhar na área de petróleo. Ele não consegue. O engenheiro Newton Amaro tem cursos de pós-graduação, 25 anos de experiência, mas se diz barrado pela idade: 49 anos. No Twitter, vários nos informam que as empresas em geral exigem 35 anos como idade máxima. Muita gente não consegue sequer enviar currículo porque as empresas estabelecem essa idade como limite. Quem tem 37 anos já seria "velho".

Atualmente, os jovens ficam mais tempo estudando, começam a procurar emprego mais tarde, aí são barrados por não terem ainda começado a trabalhar. Um me disse que aos 29 anos foi declarado "velho" numa seleção. Alguns se formaram num período em que o mercado de trabalho estava pior no Brasil. Foram para fora, hoje tentam voltar e não conseguem, apesar das habilidades valiosas adquiridas no exterior, entre elas, o domínio de idiomas.

Oswaldo Cechinel ouve sempre elogios ao seu currículo e aos seus 20 anos de experiência em cargos de gerência de empresas brasileiras e estrangeiras. Mas não tem chance porque tem 64 anos. Ele não se sente velho e acha sua experiência valiosa:

— Já tentei negociar salário, mas há muita discriminação contra a idade.

Em Tocantins, Fernanda Souza do Nascimento, 28 anos, saiu da faculdade de administração de empresas com mil planos na cabeça. Já enviou currículos para vários tipos de empresas, mas recebe sempre a mesma resposta: não tem experiência:

— As empresas querem um profissional pronto, assim fica difícil encontrar alguma coisa.

Barrados por terem idade demais, barrados por não terem experiência, recusados pelo critério burocrático de idade máxima de 35 anos, milhões de brasileiros estão neste momento cumprindo a mesma rotina: acordar de manhã, pesquisar os empregos, mandar currículos, aguardar ansiosamente resposta, se animar com alguma possibilidade de entrevista e ouvir do recrutador que seu perfil não é o que a empresa quer. Isso vai demolindo a autoconfiança e eles começam a achar que fizeram a escolha errada, ou têm algum problema que não perceberam.

Não há nada de errado com esses brasileiros. Nas muitas respostas que recebemos o que fica claro é que a empresa faz exigências descabidas, constrói barreiras desprovidas de sentido.

Neuri dos Santos, com mestrado em química, manda diariamente currículos para empresas, mas até agora nunca conseguiu um emprego com carteira assinada. Só trabalho temporário num laboratório de uma universidade:

— Às vezes dizem que sou muito qualificado para a vaga. Outras vezes perdi oportunidades por causa da idade. Não é porque eu tenho 37 anos que eu não posso continuar crescendo na profissão.

Conversamos com os departamentos de pessoal de algumas empresas. O grupo Randon disse que tem 500 vagas em diversas áreas, 5% de engenharia e nível técnico que estão há 80 dias sem preenchimento. O cenário é o mesmo na Atlas Schindler, onde a convicção é que faltam técnicos no Brasil. A mesma queixa ouvimos na Fosfértil. Um mês atrás fizemos a mesma busca em vários setores e ouvimos as mesmas queixas.

O país está crescendo, o mercado de trabalho está dinâmico, essa é a hora de as empresas abrirem suas portas, sem preconceitos. Hoje, já se sabe que a diversidade é elemento essencial para a formação de uma boa equipe. O Brasil está reclamando de apagão de mão de obra com oito milhões de desempregados.

Um comentário:

  1. Prezada Sra. Julliana Maiolino,

    Li esse texto elaborado por jornalistas conceituados que retratam a realidade brasileira e no fim deixam sua sugestão.
    Eu tenho uma opinião a respeito disso tudo, que gostaria de dividir com você e com quem mais quiser ler, e estou aberto à discussão:
    Em quase todas as áreas de trabalho nós copiamos modelos estrangeiros e também estamos copiando os mesmos erros de outros países quando analisamos o perfil de um profissional.
    Não podemos deixar de comentar que tem apenas pouco mais de 20 anos que tivemos uma profunda revolução nos campos de trabalho com o advento da informática. Entretanto apenas as novas gerações estão tendo acesso, de forma fácil, a esses instrumentos de desenvolvimento. Para os mais velhos o trabalho com essas ferramentas foi meio que a fórceps. Tivemos e ainda estamos tendo revoluções gigantescas nos equipamentos e técnicas de trabalho e, com a continua evolução, estamos obrigados a estudar continuamente para mantermo-nos atualizados. Até bem pouco tempo colocava-se no cargo de seleção de R.H. pessoas da área técnica para avaliar a capacidade do futuro profissional e via de regra, contratava-se um bom técnico, sem levar em conta o perfil psicológico da pessoa. Hoje em dia isso mudou, temos profissionais especializados para avaliação do perfil psicológico e da capacidade técnica. Até aí, tudo bem. Vejo isso como um avanço na contratação de novos e bons profissionais, que estejam tecnicamente preparados e que possuam um perfil sociável, entre outras qualidades. Nada mais correto. Entretanto, importamos um conceito estúpido de que pessoas com mais de 35 anos estão velhas para o trabalho e que um profissional recém-formado não tem experiência. Esquecemos de pensar que quando uma pessoa passa de seus trinta e cinco anos, via de regra ele já está mais amadurecido e mais comprometido com seu trabalho e com sua profissão e com isso tem muito mais a produzir que um jovem iniciante, pois aos trinta e cinco anos esbanja vitalidade. Quanto ao jovem iniciante não podemos esquecer que ele vem com informações fresquinhas e podem colaborar, e muito, para desenvolver novos caminhos, necessitando APENAS de um voto de confiança.
    Em minha opinião as novas mentes de Recursos Humanos deveriam projetar-se no futuro e pensar como eles estarão quando estiverem com seus 35 anos, e se gostariam de serem substituídos, como filtros de óleo lubrificante do motor de um carro. Pois o que se planta hoje, se colhe amanhã.
    Trabalho em uma sólida companhia de prospecção de petróleo, tenho 47 anos e apenas 9 meses de empresa. Fui entrevistado por verdadeiros profissionais de R.H. que avaliaram meus perfis e me concederam a vaga que ocupo atualmente. No navio em que trabalho, a média de idade dos profissionais e dos contratados gira em torno de 40 anos. Para minha alegria observo profissionais de 65 anos de idade trabalhando como se tivessem 20 anos. Carregam em seu bojo décadas de experiência, décadas de vivência e compartilhar isso tem sido um presente para mim.
    Enquanto vocês, queridos BRASILEIROS, profissionais de R.H, não entenderem que temos que criar uma análise do profissional que leve em conta nossa história, nossas características e nossas habilidades continuaremos a dizer que TEMOS VAGAS MAS NÃO TEMOS PROFISSIONAIS QUALIFICADOS.

    Essa é uma simples opinião de um velho profissional ou seria, um profissional velho, risos.

    PAZ, SAÚDE E AMADURECIMENTO PARA TODOS

    Aimoré Homsi
    Chefe de Eletrônica
    Deepwater MILLENNIUM
    TRANSOCEAN

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